METANÁLISE DO EXAME DE URINA TIPO I (EAS)
EXAMES DE URINA TIPO I
Análise, Interpretação e Função da Urina Tipo I
A urina é de composição que varia em torno das seguintes proporções: água 95%; resíduos orgânicos, 3,7%; e resíduos inorgânicos, 1,3%. A análise quantitativa e qualitativa desses componentes pode fornecer grande número de elementos na pesquisa da fisiopatologia renal, na qual o exame de urina é considerado um dos mais importantes, bem como para inúmeras outras afecções localizadas em outros setores do organismo.
URINA TIPO 1 CARACTERÍSTICAS
De acordo com o padrão uniformizado pelo Departamento de Patologia da Associação Paulista de Medicina, o exame de urina tipo I inclui caracteres físicos (volume, aspecto, cheiro, cor, densidade e pH) caracteres químicos (pesquisa de proteínas, açúcares, corpos cetônicos, bilirrubina, urobilinogênio, uréia, creatinina e ácido úrico); e finalmente o exame microscópico do sedimento* Contudo, na prática hospitalar há uma separação entre a Urina Tipo I Simples, que não inclui a análise microscópica, e o Sedimento Urinario Quantitativo, que é específico para a análise dos elementos não dissolvidos na urina.
Sobre a coleta: diferentemente de alguns exames colhidos através do sangue, cujas orientações se restringem à dieta, quando você solicitar o sumário de urina deverá passar informações importantíssimas para o paciente, sendo elas:
A primeira urina do dia é que será idealmente colhida, pois ela está mais concentrada, o que facilita a avaliação dos seus elementos.
Como o coletor cheio por muito tempo está sujeito a contaminações, ele deve ser entregue o mais rápido possível no laboratório para o armazenamento adequado, sendo IDEAL que o paciente - caso consiga - colha a primeira urina apenas após chegar ao laboratório.
O início do jato deve ser descartado, pois ele irá carregar para o exterior as impurezas acumuladas no trato urinário, coletando assim o jato médio.
Com a mesma finalidade, a região genital deve ser higienizada antes da coleta e o paciente homem deve manter retraído o prepúcio e a mulher afastados os grandes lábios, garantindo assim maior pureza do material colhido.
ANÁLISES DE RESULTADOS E ETAPAS
Será analisada em 3 etapas, que serão dissociadas no laudo. As etapas consistem no exame físico, químico e sedimentar.
ETAPA DE EXAME FÍSICO
No exame físico, iremos analisar o volume, aspecto e a coloração da amostra. O volume é simples, apenas nos informa a quantidade de líquido que consta no frasco, nos dizendo se o paciente coletou ou não a quantidade mínima necessária (40 ml) para realização do exame. Posteriormente, observamos o aspecto, que basicamente define visualmente se a amostra é límpida ou turvica, que varia de acordo com alguns fatores presentes, como debris, esperma, descamações, bactérias e outras substâncias. Geralmente não tem nenhuma relação com o estado clínico do paciente.
A coloração, por sua vez, adota um aspecto amarelo citrino, que pode variar de acordo com a concentração e patologias que podem deixar as amostras mais avermelhadas, acastanhadas (associada a hematúria - presença de sangue) e também, cor verde, característico de icterícia, ocasionado por efeitos colaterais do uso de medicamentos prolongados como anti-helmínticos.
ETAPA DE EXAME QUÍMICO
A maior relevância clínico para o paciente e principalmente para o profissional biomédico na execução dos exames está na parte químico, realizado através das fitas reagentes, que irá nos informar: pH, densidade, glicose, corpos cetônicos, bilirrubina, urobilinogênio, nitrito, hemoglobina, proteínas.
O rim obrigatoriamente excreta H+, assim fica fácil entender que na maioria dos indivíduos o pH da urina se encontra ao menos levemente ácido. Esses valores variam com qualquer desequilíbrio ácido-base do organismo ou da mudança de dietas específicas. Além disso, um exemplo bastante citado nas literaturas é o de pacientes em quadro de infecção do trato urinário que apresentam a urina alcalina, sugerindo fortemente que o agente etiológico nesse caso seja o Proteus sp.
Para entendermos a Densidade, devemos ter em mente que a densidade da água pura (tida como basal) é igual a 1000. Dessa forma, podemos concluir que a urina sempre vai estar com valor acima deste, variando desde o 1005 (quando mais diluída) até o 1035 (mais concentrada). O processo básico de alteração da concentração é a ingesta de líquidos e sua eliminação.
Falando em Glicose, sua eliminação pela urina (a glicosúria) pode significar principalmente duas situações. Sabendo-se que fisiologicamente a glicose é reabsorvida pelos túbulos renais, podemos entender que ela irá ser excretada tanto em situações em que esteja aumentada na circulação (como Diabetes Mellitus - desde que esteja com valores bastante elevados de glicemia), quanto em casos onde haja comprometimento tubular dos pacientes. Dessa forma, caso estejamos com um paciente não diabético que apresente glicosúria, deve ser investigado patologias renais.
Os Corpos Cetônicos, ou cetonas, são resultado da metabolização incompleta de ácidos graxos, que acontece quando o indivíduo não apresenta a quantidade adequada de carboidratos para gerar energia. Podem estar presentes em situações como cetoacidose diabética, desnutrição, exercício físico intenso, entre outros. Em geral, dada a sua gravidade, a cetonúria não se apresenta isolada no paciente, devendo o achado ser correlacionado com a história clínica e as demais manifestações sistêmicas.
A Bilirrubina normalmente não é excretada pela urina, mas sim pelas fezes. Situações como a colestase fazem com que essa substância se concentre na corrente sanguínea e levam à excreção renal, caracterizando a bilirrubinúria. É seu pigmento que vai levar ao surgimento da já citada colúria (urina cor de coca-cola), que surgirá quando a bilirrubina apresentar altos níveis urinários.
O Urobilinogênio, por sua vez, é o resultado do metabolismo bacteriano da bilirrubina no intestino, sendo grande parte eliminada nas fezes e outra reabsorvida e fisiologicamente excretada na urina. Quando seus valores estão acima do valor de referência, o paciente pode estar apresentando principalmente constipação, que irá diminuir a eliminação fecal dessa substância e aumentar a urinária, excesso de bactérias intestinais, que aumentam a quantidade em ambas as vias, ou hemólise excessiva.
O nitrato é um metabólito normalmente presente na urina. Porém, quando existem bactérias gram negativas no trato urinário, esse nitrato é convertido em Nitrito. A presença deste, portanto, sugere a presença de bactérias, mas não é suficiente para confirmar, uma vez que essa confirmação só se dá através da realização da Urocultura (ou Urina Tipo 2).
Detectar a presença de hemoglobina (hemoglobinúria) irá se relacionar com a hematúria (presença de hemácias na urina), confimando-a caso haja aumento de hemácias no exame sedimentar, como será melhor abordado mais adiante. No entanto, uma situação clínica que levaria à hemoglobinúria com ausência de hematúria seria a hemólise intravascular - pois apenas os componentes da hemácia seriam eliminados.
Abordando por fim as proteínas, destacamos que a única delas que a fita reagente consegue captar é a albumina (o que faz com que exames específicos precisem ser realizados quando se busca microalbuminúria, por exemplo). Em situações normais, o indivíduo não excreta muita albumina devido às características dessa molécula, que fazem com que não possa atravessar a membrana. Isso torna normal e esperado nos exames apenas "negativo" ou "traços" para sua presença. Quando encontrada, a proteinúria será graduada no exame em:
1+ (cerca de 30mg/dL);
2+ (cerca de 100mg/dL);
3+ (cerca de 300mg/dL) ou 4+ (1000mg/dL ou mais).
É importante ressaltar que esses valores têm baixa acurácia e que o exame de urina não é ideal quando se deseja quantificar a proteinúria de um paciente. Para isso, devemos fazer uso da proteinúria de 24h, dosar creatinina, entre outras possibilidades.
Se estivermos lidando com uma proteinúria transitória, podemos associá-la ao estresse, febre, insuficiência cardíaca congestiva, exercício exagerado ou distúrbios convulsivos.
Em casos de proteinúria persistente, se for leve podemos pensar em situações benignas como o exercício exagerado de forma crônica, ou em situações mais graves buscar por síndrome nefrótica, glomerulopatias e outras patologias renais que levem a uma maior permeabilidade na membrana.
ETAPA DO EXAME SEDIMENTAR
A última parte do exame é a análise sedimentar, onde a urina coletada é avaliada através pelo biomédico através da microscopia, descrevendo os elementos ali visualizados. Podemos identificar: leucócitos, hemácias, células epiteliais, bactérias, cristais e cilindros. Vamos entender o que significa a presença desses elementos quando vistos pelo microscópio.
Assim com no hemograma, os leucócitos na urina indicam infecções e inflamações, e neste caso, contaminação da amostra. O normal é encontrarmos de 2 a 5 unidades por campo, acima disso caracteriza-se leucocitúria. Atenção, é preciso relatar qual célula branca está aumentada para facilitar a busca pela causa sistêmica ou local.
Só é comum observar a presença de até 2 hemácias por campo, acima disso, classificamos hematúria no paciente.
Células epiteliais na amostra, brevemente, são resultado da descamação do trato urinário, algo normal sem muita importância clínica. Devemos nos atentar apenas quando os valores ultrapassam 15-20/campo, isso sugere uma amostra de urina contaminada.
Indivíduos saudáveis e assintomáticos não devem apresentar bactérias na urina, porém, dada a flora natural, é comum que haja uma pequena quantidade, relatada como ''traços'' no exame pelo biomédico. Lembrando que apenas o exame de urocultura pode fornecer o diagnóstico definitivo de infecção urinária.
Os cristais surgem da precipitação de sais presentes na urina, e o material que forma esses cristais indica a sua origem e o que ele pode significar. Por fim, temos os tão desconhecidos Cilindros. Imagine o formato dos túbulos do néfron e que sua luz é semelhante à de um tubo qualquer. Por ser tão pequena, é comum que às vezes proteínas de coagulação secretadas pelas células tubulares durante a passagem se condensem e adquiram esse formato cilíndrico, recebendo daí o seu nome. Semelhantemente aos cristais, podem ser compostos de diversos materiais e isso virá descrito no exame, mas também não iremos nos ater à sua complexidade.
REFERÊNCIA:
- MICROBIOLOGIA MÉDICA - MURRAY, ROSENTHAL, PFALLER;
- The Basics of Specimen Collection and Handling of Urine Testing - (ASCP);
- University of Glasgow - (Urinalysis Clinial Skills Guidance);
- Adaptado de MdicPlus Exame De Urina (EAS): Dominando A Interpretação Dos Resultados;