TRANSCRIÇÃO
Transcrição
O Fluxo da Informação Genética
Após a elucidação da estrutura molecular do DNA e a constatação de que a informação deveria estar codificada na seqüência de DNA, começaram as especulações de qual seria a relação entre a seqüência de nucleotídeos do DNA e a seqüência de aminoácidos nas proteínas, e o sistema operacional para a célula processar essa informação. Uma vez que as evidências experimentais demonstravam que a síntese protéica era proporcional à quantidade de RNA (isto estava de alguma forma equivocado, visto que o RNA observado não era o RNA mensageiro, mas o RNA ribossômico), sugere-se que o RNA poderia ser esse intermediário. Citologicamente essa proposta era possível, porque o RNA está presente tanto no núcleo quanto no citoplasma. Além do mais, o RNA possui propriedades compatíveis com essa função:
1. polinucleotídeo;
2. composição de bases reflete a composição de bases do DNA;
3. heterogêneo em tamanho;
4. sintetizado e degradado rapidamente.
Essas considerações resultaram na hipótese conhecida como o Dogma Central da Biologia, segundo o qual o fluxo da informação ocorreria no seguinte sentido:
SOBRE A SÍNTESE DE RNA
O processo de síntese de RNA constitui a etapa inicial do fluxo da informação e é denominada transcrição. A caracterização desse processo é indispensável para a compreensão do funcionamento celular. Num determinado momento, durante a fase S uma seqüência determinada atua como molde para a replicação da molécula de DNA, em outra etapa, geralmente fora da fase S do ciclo celular, a mesma seqüência é utilizada como molde para a transcrição da molécula de RNA.
A proteína que na E. coli catalisa a síntese de RNA utilizando DNA como molde é a RNA polimerase. Essa holoenzima é composta de cinco polipeptídios ligados não covalentemente: duas subunidades α com peso molecular de 40.000 Daltons, uma subunidade β com peso molecular de 150.000 Daltons, uma subunidade β' com peso molecular de 160.000 Daltons e uma subunidade σ com peso molecular de 90.000 Daltons (veja a Figura 3.6). A polimerase principal, com capacidade de sintetizar as ligações fosfodiéster, não contém a subunidade σ (sigma) e sua composição é α2ββ'. A subunidade σ é necessária para o início da transcrição, enquanto outra proteína, denominada fator rho (ρ), é importante para o término da transcrição. Nas células eucarióticas três tipos principais de RNA polimerases são encontrados, cada um com grande complexidade de subunidades. Essas polimerases podem ser distintas por sua localização celular e pela sensibilidade a uma toxina de fungos, a α-amanitina. A RNA polimerase I é encontrada no nucléolo, é resistente à α-amanitina e transcreve os rRNA grandes. A RNA polimerase II é encontrada no nucleoplasma, é sensível a baixas concentrações de α-amanitina e é a principal enzima responsável pela síntese do RNA heterogêneo nuclear, que é posteriormente processado em mRNA. A RNA polimerase III é também encontrada no nucleoplasma, é sensível a altas concentrações de α-amanitina e sintetiza o tRNA e rRNA 5S. Também são encontradas RNA polimerases nas mitocôndrias e nos cloroplastos.
A TRANSCRIÇÃO DO RNA
O processo de transcrição é um processo altamente seletivo que produz repercussões importantes em todas as atividades celulares. Esse processo não ocorre espontaneamente, mas é determinado por uma lógica ainda pouco compreendida. Alguns aspectos desse funcionamento parecem ser programados mostrando convergências importantes com o padrão de desenvolvimento. O desenvolvimento só é possível por esse padrão diferenciado de transcrição. No entanto, há também uma influência de fatores ambientais nesse processo. É mais fácil descrever esse processo em bactérias porque é mais simples que a transcrição em eucariotos.
Tecnicamente, a transcrição é dividida em três etapas:
1) Início − ligação da RNA polimerase aos promotores e aos iniciadores de cadeia, determina o início da transcrição;
2) Alongamento − RNA polimerase copia a seqüência do DNA, liberação do fator σ, polimerização 5'→3', velocidade 30 nucleotídeos/segundo, fita molde de DNA 3'→5';
3) Término − sinal de terminação, liberação das moléculas de RNA, liberação da RNA polimerase, molde de DNA conservado.
1) ETAPA - INÍCIO
A seqüência do DNA que sinaliza o início da transcrição é denominada promotor. A RNA polimerase reconhece o promotor como uma estrutura do DNA de fita dupla. Embora possa ocorrer no DNA separação local das cadeias, não é suficiente para expor o número de bases necessárias para o sinal específico de início da síntese de RNA. Assim, a polimerase possivelmente acessa a seqüência promotora por meio das alças da estrutura do DNA. A subunidade σ na E. coli tem uma função decisiva nessa etapa do reconhecimento, interagindo covalentemente com o DNA sobre aproximadamente 12 pares de bases.
Após a polimerase encontrar a seqüência correta, em virtude da ligação não covalente das alças da estrutura do DNA entre as bases e a enzima, as cadeias devem ser separadas para possibilitar o pareamento dos precursores no molde. Esse processo envolve a formação de ligações iônicas entre os aminoácidos básicos da enzima e os grupos fosfato acídicos do DNA. Utilizando a energia liberada pela formação das ligações iônicas, as cadeias são mantidas separadas. Estima-se que aproximadamente 7 pares de bases, próximos ao local da interação do molde com o precursor, são separados pela polimerase.
Uma seqüência de consenso é o protótipo da seqüência de bases que sumaria as bases encontradas mais freqüentemente em cada posição na análise das seqüências individuais de diversos promotores.
Nos eucariotos, a posição é um pouco diferente dos procariotos, mas a seqüência de consenso também apresenta homologia. As seqüências de consenso não são idênticas, mas possuem características comuns, com diferenças de poucas bases. A transcrição depende da seqüência promotora. Há necessidade de ativação do promotor por uma proteína, como o fator sigma nos procariotos, para que ocorra a transcrição. Desta forma, a razão de transcrição depende da quantidade de proteína ativadora disponível, quanto maior sua concentração mais rapidamente encontrará e se ligará ao promotor.
A razão de transcrição depende também da potência do promotor. Se a seqüência promotora se encaixa perfeitamente ao sítio de ligação, o gene será transcrito freqüentemente. Por outro lado, se a seqüência promotora é similar ao sítio ideal de ligação, mas não há um encaixe perfeito, a seqüência será transcrita menos freqüentemente, porque a ligação do ativador será mais tênue. A seleção atua a favor da afinidade adequada − nem todos os promotores são sítios de ligação ideais, porque nem todos os genes precisam ser transcritos na razão máxima.
2) ETAPA - ALONGAMENTO
O alongamento da cadeia ocorre no grupo hidroxil livre 3'. A informação para a síntese é fornecida pelo DNA molde e o alongamento é efetuado pela enzima RNA polimerase. A relação espacial entre a RNA polimerase e o DNA molde não é conhecida em detalhes. A holoenzima, quando ligada ao DNA, pode proteger da digestão com nucleases um segmento de aproximadamente 65 pares de bases.
O mecanismo de ação de diversos antibióticos se dá por meio do bloqueio na síntese de RNA. Alguns, como a actinomicina-D, bloqueiam a transcrição, intercalando-se entre os pares de bases sucessivos no DNA molde. Outros agentes que atuam desta maneira são a aflatoxina-B e o brometo de etídeo, que em baixas concentrações mostra especificidade para o DNA mitocondrial.
3) ETAPA - TÉRMINO
Para prosseguir com a síntese de RNA, a polimerase principal e a cadeia nascente de RNA devem manter contato satisfatório com a seqüência de DNA. Quando um segmento de nucleotídeos do DNA com pouca afinidade (seqüência de terminação) é encontrado, há uma tendência para a dissociação da polimerase e do RNA e o término da transcrição. Dois elementos têm uma função importante nesse processo. O primeiro é a estrutura secundária da cadeia nascente de RNA. A maioria das seqüências de término tem uma repetição invertida que permite ao produto a formação de uma estrutura em gancho. Isto provavelmente atua como um freio para a polimerase, causando uma diminuição ou pausa no seu progresso ao longo do DNA molde.
O processo de transcrição é assim um evento conservativo que não produz modificações na molécula de DNA que serviu de molde, sendo a molécula de RNA resultante complementar à molécula de DNA utilizada como molde para a sua síntese. A cadeia molde tem orientação 3'-5', enquanto a cadeia complementar do DNA é denominada cadeia não molde e tem orientação 5'-3'. Além disso, a cadeia não molde possui a mesma seqüência de nucleotídeos da cadeia de RNA (substituindo-se T por U), sendo também denominada cadeia sense, enquanto a cadeia molde é denominada anti-sense.
Vale lembrar que apenas uma das fitas serviu de molde para a síntese de RNA. A fita complementar também pode conter informações, mas o conteúdo dessa informação é diferente, o que aumenta o potencial de armazenamento da informação pelo DNA. Desta forma, a unidade do DNA funcional ou UNIDADE DE TRANSCRIÇÃO é definida como um segmento de DNA (gene ou genes) transcrito em uma única molécula de RNA pela RNA polimerase. Essa unidade é mais ampla que a seqüência transcrita, os promotores fazem parte dessa unidade. Outros elementos genômicos também podem influenciar a freqüência com que cada unidade de transcrição é ativada, como os potenciadores, os operadores e os silenciadores.
REFERÊNCIA:
- Biologia Molecular da Célula: Alberts Johnson Lewis 6°edição;